Como fiz para analisar 160 currículos em menos de 5 minutos

A inteligência artificial contratou uma pessoa para mim (de novo)

Dizem que a IA vai tomar o emprego das pessoas. Aqui no Tintim, ela está agindo ao contrário: ajudando a dar emprego às pessoas.

Na edição de hoje da Newsletter do Moa, eu conto como usei inteligência artificial para analisar mais de 160 currículos de forma profunda e precisa (e em menos de 5 minutos).

As dores do crescimento

Estamos crescendo bastante aqui no Tintim. Em menos de dois anos e meio, estamos próximos dos R$ 500k MRR. Esse rápido crescimento demanda uma reconfiguração praticamente completa no time de tempos em tempos.

O time do Tintim já passou por três grandes fases. A primeira delas foi quando eu, Ronaldo, Júnior e Luiz colocávamos a mão na massa. Cada um tinha muitas responsabilidades específicas e pouco dinheiro disponível. Foi assim até os R$ 100k MRR, mais ou menos.

Depois, entramos na fase em que eu era o grande gestor de tudo, e os outros assumiram a cadeira de “supervisores". Nessa etapa, cada um já tinha um time com pessoas menos seniores, e o papel deles era de, aos poucos, descentralizar o trabalho, antes feito por apenas um, para o time. Essa fase foi até, mais ou menos, uns R$ 300k MRR.

Agora, estamos na terceira fase, em que eu sou o líder dos líderes, e os outros membros do founding team estão se tornando gestores. Estamos começando a consolidar uma segunda camada de liderança, logo abaixo de mim.

Acontece que eu nunca fui “somente” o CEO. Interinamente, eu sempre cuidei, também, de marketing e produto. Além da posição de “grande gestor”, eu também fui um supervisor dessas áreas. Eu também tenho um time nessas áreas e uma das minhas atuais missões é descentralizar responsabilidades. Por isso, surgiu a necessidade de contratar um product manager com bastante know-how para assumir a supervisão da área de produto.

Essa é uma posição bem específica e também bem estratégica. Fazer essa contratação não é simples, e um erro aqui pode custar MUITO caro. Por isso, decidi pedir ajuda a um consultor especializado em contratar product managers.

O consultor me ajudou em todo o processo. Ele ajudou a definir o perfil de pessoa que precisávamos, dado o nosso cenário. Ele ajudou a escrever a vaga. Ele ajudou a criar o desafio que iríamos aplicar (eu falo que ele ajudou, mas, quem tocou o processo foi ele rs).

Em menos de uma semana de trabalho, definimos todo o escopo e publicamos a vaga no LinkedIn. Dei uma pequena impulsionada financeira para acelerar o processo e, menos de 24 horas depois, a gente tinha nada menos do que 162 aplicações. Lindo, né? Impossível não achar o perfil perfeito no meio de tanta oferta.

Acontece que, no momento em que parei para analisar os currículos, eu descobri que a interface do LinkedIn é HORRÍVEL. De repente, eu me vi diante de 162 currículos a serem analisados, e sem nenhum tipo de segmentação objetiva para me ajudar. Eu teria que ler, atentamente, CENTO E SESSENTA E DOIS currículos.

Qual a chance?

Vou usar IA para me ajudar

"Eu prefiro escolher uma pessoa preguiçosa para fazer um trabalho complexo, pois ela vai encontrar uma maneira fácil de fazer aquilo"

Bill Gates

Eu sou um baita preguiçoso. Nem ferrando eu iria analisar 162 currículos na mão. Foi quando eu tive a ideia de usar inteligência artificial para me ajudar no processo.

O plano era simples:

  1. Baixar os dados dos perfis que aplicaram para a vaga;
  2. Pedir ao GPT para analisar e classificar os currículos;
  3. Filtrar e analisar manualmente somente os candidatos que passassem neste primeiro filtro.

Com o plano em mãos, fui à execução!

Baixando os dados

Essa, sem dúvida, foi a parte mais difícil. Como disse, a usabilidade do módulo de recrutamento do LinkedIn é horrível, portanto, não havia uma forma fácil de baixar os dados. O dado que eu precisava, especificamente, era a URL do perfil público do candidato. Com isso, eu conseguiria usar uma API para baixar o currículo do candidato em formato json, e enviar para a IA analisar.

Mas, não tinha uma forma fácil de conseguir essa URL. Aqui, eu tinha dois caminhos: baixar esse dado manualmente (passar por cada aplicação, copiar o link e colar em algum lugar), ou “hackear” a interface do LinkedIn. Escolhi a segunda opção.

De forma resumida: eu inspecionei a requisição que era feita conforme eu paginava a lista de aplicações, e então pedi para o ChatGPT escrever um script que replicasse essa requisição (com os parâmetros de autenticação no header), iterasse por toda a lista e baixasse esse dado.

Essa foi, de longe, a parte mais chata do processo. Mas, consegui!

Com o link do perfil do candidato, eu recorri ao meu site predileto para assuntos relacionados a scrapping de dados: RapidAPI. Mais especificamente, usei uma API específica de LinkedIn que é comercializada nesse marketplace. O uso era super simples: eu passava a URL do perfil de LinkedIn do candidato via parâmetro, e a API me devolvia os dados do perfil de forma estruturada.

Pronto! Agora eu tinha todos os dados dos candidatos.

Analisando os perfis com ajuda da IA

A estratégia aqui era a seguinte: disponibilizar para a IA a descrição da vaga, disponibilizar os dados do candidato, e pedir para ela classificações objetivas para que eu conseguisse fazer filtros.

As classificações foram bem simples:

  • O candidato possui experiência compatível com a vaga?
  • O candidato possui skills compatíveis com a vaga?
  • O candidato possui formação compatível com a vaga?
  • O candidato possui fit perfeito com a vaga?

Além disso, pedi também para que a IA fizesse um breve resumo da experiência, dos skills e da formação do candidato. Por fim, pedi para a IA justificar sua resposta em relação ao fit perfeito com a vaga.

Gerei um CSV com o resultado das análises e voilà!

O resultado final

Dos 162 currículos analisados, a inteligência artificial disse que 29 possuíam as skills compatíveis, 48 possuíam a experiência compatível, e 24 possuíam a formação compatível com a vaga. Por fim, 23 candidatos possuíam fit perfeito com a vaga.

Eu analisei manualmente 10 respostas positivas e 10 respostas negativas. Fiz isso com o objetivo de validar se não havia nenhum falso positivo. A minha conclusão foi que as avaliações da IA foram ABSURDAMENTE boas.

No fim das contas, acabamos contratando uma candidata que não possuía fit perfeito com a vaga, segundo a IA. De fato, a candidata não possuía a experiência necessária. Porém, isso não significa que a IA errou. O que aconteceu foi que mudamos de estratégia. Isso só foi possível porque ter os dados de forma estruturada nos permitiu fazer análises mais aprofundadas.

A IA foi fundamental para nos ajudar a aproveitar 100% dos dados que tínhamos disponíveis. Sem essa ajuda, a chance de uma análise superficial era muito grande, dado o volume de candidatos disponíveis.

Aprendizados

Pelo amor de Deus não use a ferramenta nativa de avaliação do LinkedIn

Um formulário é muito mais simples. O LinkedIn te dá a opção de colocar um link externo de aplicação, ao invés de usar a própria ferramenta deles. Divulgar o link de um Google Forms da vida já é mais do que suficiente. Aí, no formulário, você pede para o candidato informar o link do seu perfil no LinkedIn. Já é meio caminho andado.

Se você quiser, pode ir além, e pedir o endereço de outras redes sociais, por exemplo, para fazer uma primeira triagem de fit cultural.

O prompt correto faz toda a diferença

Eu fiz todo o processo através da API da OpenAI. Isso significa que você não tem a oportunidade de “conversar” com a IA para refinar sua resposta. Em casos como esse, o seu prompt deve ser o mais detalhado possível.

Por sorte, meu amigo Marcelo Abreu fez um belo post contando tudo o que aprendeu sobre engenharia de prompt. Segui a estrutura apresentada à risca, e o resultado foi excelente.

Análises complexas exigem modelos avançados

Eu cheguei a testar o gpt-4o mini, mas, o resultado não ficou bom. Acabei usando o modelo gpt-4o para fazer toda a análise.

No total, eu gastei uns US$5 para fazer toda a análise. Isso é caro, se olharmos em preços de API. Mas, é extremamente barato, se olharmos o tempo que economizei e a assertividade que alcancei (dificilmente um estagiário, até mesmo um júnior, alcançaria esse nível de qualidade).

Um bom descritivo de vaga faz toda a diferença

“Pra quem não sabe o que quer, qualquer caminho serve.”

O óbvio precisa ser dito: você só terá bons resultados usando IA se fizer boas perguntas. Investimos um esforço grande em entender nossas necessidades e, então, traduzir isso numa vaga bem completa e descrita.

Com certeza esse trabalho foi crucial para termos um resultado rápido e de qualidade.

E aí, gostou?

E você: o que tem feito de não óbvio com ajuda de IA?

Me conta nos comentários.


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Curioso, de um lado tem "usando IA para aplicar em 160 vagas" do outro "analisando 160 currículos usando IA". A frase "Em terra de cego quem tem olho é rei" nunca ficou tão presa na minha mente... No caso "Em terra de IA, quem é autêntico é rei", mas não me entenda mal não é uma crítica ao post nem ao método nele descrito, longe de mim, tenho usado IA para tudo também. (Pensando alto) Sinto que em algum momento será necessário criar formas para validar a autenticidade de conteúdos, serviços e etc... Mas como?

Acho que em ambos os casos estamos otimizando nosso tempo. Não vejo problema em uma pessoa aplicar para 160 vagas, seja com IA ou sem IA. Se a aplicação for de qualidade, vai chamar atenção do recrutador. O que não pode é usar IA para mentir. IA é ferramenta. Se usada bem, trás benefícios. Se usada mal, trás malefícios. Tão simples quanto isso.